minha mãe me liga chorando: zé mandioca morreu.
e quem é esse com apelido tão digno de conotações e denotações, me perguntam vocês.
era - agora - um bêbado, velho, sozinho no mundo. nos últimos tempos não passava disso. no mais, sempre desempenhou bem o seu papel de maluco de praça de cidade do interior, desses que cada qual cidadezinha tem o seu.
eu não sei porque minha mãe chorava, mas eu bem posso imaginar se tomar por base o que representou para mim o zé. eu me lembrava dele das épocas em que eu, lá com 5 ou 6 anos, ficava na varanda do sítio e ele aparecia para trabalhar daquele jeito de quem chegou da cidade com 'sangue nos zóio', como se diz: vinha de longe trançando as pernas.
meu vô (outro que já faz falta, menos por feitos heróicos, mais pela personalidade excêntrica e cativante) ralhava com o zé, mas ele não se importava e todo dia tratava de dar as caras no bar.
é certo que meu vô deve ter dispensado os trabalhos dele, porque não há patrão que aguente o bafo da cachaça e toda a indisciplina que com o tempo ela impõe ao peão.
o zé sumiu pra um lado, eu sumi pro outro, duartina virou um parênteses entre a minha vida e a vida do homem que usava chapéu de palha.
coisa de 18 anos depois eu voltei pra morar mais uma vez no sítio e o zé, quem diria, virou vizinho. arrumou ele também uma casinha no sítio ao lado e foi provar que há coisas que nunca mudam.
apareceu e eu reconheci de longe: chapéu de palha e o mesmo trançar de pernas. chegou pedindo café e logo foi mandando: 'como tá bonita a carolina'.
eu reconheci de longe mas duvidava que ele, com tantos anos e goles na cabeça, pudesse ainda lembrar de mim. pois lembrou.
cada um escolhe a forma que quer pra fazer as pessoas serem importantes pra vida delas. eu escolho essa: a poesia que elas têm sem saber quem têm.
o zé morreu sozinho, sem velório, sem padre, nem vela, mas com choro meu.
minha intenção é fazer aqui pelo menos um post por mês e eu peço desculpas por maio começar triste. mas é que o vinícius falou que pra se fazer um samba com beleza é preciso um bocado de tristeza e eu digo que não é só samba não.
*a notícia da morte do zé veio no dia da morte do osama. o zé escolheu o dia certo, pois a mim só fez parecer mais desimportante o que já era duvidoso. meus dramas pessoais têm muita relevância.
11 comentários:
Eu sumo, mas volto... e continuo adorando os textos da Carol!
bjo bjo!!!
Droguinha, to no pc da Marina, mas quem escreveu foi a Anamaria tudojunto! =p
Carol tudo certo, mas pelo menos 2 por mês vá!
Que lindo amiga, nossos sentimentos ao Zé Mandioca, descanse em paz!!!
adorei o texto, como sempre, muito envolvente, parabéns gata !!!
bjss de sua amiga !!!
Boa !
É assim, aos poucos, perdendo os referenciais, que a gente vai ficando meio à deriva.
Adorei o Blog, tomei a liberdade de compartilhar em minha página! Bjo! http://jocih.blogspot.com/
É impressionante como toda cidade interiorana tem essas figuras -- ou talvez, pela imensidão de gente e bairros, as que pertencem aos grandes centros se percam no cenário.
Eu mesmo já encontrei um monte, mas a que mais me intrigou até hoje nunca pude conhecer. Meus pais me contavam de um, em Guaxupé-MG, já falecido, que se achava um caminhão e andava pelas ruas mudando de marcha e dando seta na hora de se virar. Fantástico!!!
poxa marcelo. já ouvi por ai a história do homem-caminhão! haha. pelo jeito, ele ficou famoso.
Me lembrei também do "Finca", que saia falando pra mulherada na rua que ia dar "fincada" em todas elas...
sou a mais recnte leitora do seu blog, gostei muito me fez rir em momentos tão dificeis.
fico, de verdade, muito feliz :)
Postar um comentário