04 setembro 2009

O subversivo

A delegacia de polícia de Dois Córregos fica no meio de uma pracinha florida. Sua porta de entrada – a única – é feita de madeira e fica em cima do quinto degrau da pequena escadaria que todos têm que subir para entrar no pequeno prédio de um corredor e cinco salas. E foi por essa escadaria que, numa tarde ensolarada de segunda-feira, o bêbado subiu. Tinha meia-idade e estava visivelmente bêbado, sujo e mal-vestido. Eu, que escrevia uma reportagem sobre as mulheres da cadeia, estava sentada no único banco, velho e de madeira, do corredor da delegacia. Cheguei cedo, antes do final do horário de almoço do delegado e tive que esperar. Olhava para a ponta de um dos meus tênis sujos quando o bêbado passou por mim. Ele parava de porta em porta e cumprimentava alguns pelo nome, outros por “ô meu cumpadre!”. Uns riam, outros respondiam educadamente “bom dia, como vai?”, outros ainda eram mais diretos “não me venha encher o saco”. Cumprido o ritual que me pareceu ser rotineiro, o bêbado, no final do corredor, deu uma meia-volta cambaleante e voltou, novamente parando de porta em porta: “Ô, Maria, me arruma um real pra comprar um pão?”. “Ajuda eu, rapaz!”. Ninguém ajudava e ele mudava de sala. Na última porta, que era também sua última esperança, ele implorou : “Por favor, um dinheirinho?”. O menino, que pelo andar desajeitado e espinhas no rosto eu julguei ser o office boy levantou da frente do computador, tirou do bolso uma carteira de couro e entregou ao bêbado uma nota que, de onde eu estava, não pude ver o valor. O bêbado sorriu, colocou a mão no ombro do rapaz e agradeceu daquele jeito que os bêbados agradecem: “Ô, meu filho, que Deus te abençoe”. Desceu as escadas da delegacia guardando a nota no bolso de trás e quando pulou do último degrau, ainda de costas para a velha porta de madeira, ergueu os braços e deu seu grito de liberdade: “É hoje que eu compro macooonhaaa!”.

7 comentários:

Carolina Filipaki disse...

Hahahaha
Mto bom! Eu gosto de blogs pq eu sempre fico imaginando quais histórias são reais, quais são totalmente inventadas e quais são um pouco de cada! rs

Jefferson Pacaembu disse...

Gostei demais!!! O final me pegou de surpresa... acho que a delegacia de Dois Córregos é maior que a de Pacaembu.

Anônimo disse...

Muito legal a história, estou conhecendo o blog agora, parabéns!

Anônimo disse...

Certa Vez um b~ebado me parou na rua e me pediu dinheiro, dizendo - vou ser honesto contigo - não é pra leite das crianças não, é pra cachaça mesmo. Pela honestidade, parei no buteco e tomei uma com ele.

Unknown disse...

em gália as pessoas são mais diretas: "me descola 1 real pra eu comprar um baseado", "intera cinquenta centavos pra cachaça", "empresta uma folha de caderno pro mesclado" e blábláblá.

Anônimo disse...

um dia feliz pro bebaça!! Legalize marijuana!!

anamariacorri disse...

Kakakakakka
fikei imaginando q no fim teria uma lição de moral auhhuahuahuahuahuauha
boa boa óootima na vdade huauhahua