04 maio 2012

é triste a saudade

quando eu era criança minha mãe trabalhava no fórum municipal e, para minha sorte, a parte dos fundos do prédio dava bem na lateral da escolinha onde eu estudava. na hora do recreio eu corria para o lado da escola e minha mãe aparecia lá no fundo para me mandar um beijo. às vezes, quando a aula acabava, eu ia para o fórum esperar ela sair.

numa dessas vezes, ela contava para as colegas que um senhor famoso tinha ido lá. para mim, ela explicou: era um senhor que meu avô gostava de ouvir cantar. aquele senhor, que junto com outro, sorria na capa do disco que numa tarde eu, sentada no chão, coloquei na vitrola enquanto meu avô, sentado na cadeira, me observava.

eu não tinha mais que cinco anos. abri a gaveta do móvel de madeira escura da sala da casa dos meus avós e fiz o que criança gosta: bagunça.

meu avô, na cadeira, fez o que os avós gostam de fazer: olhar o neto fazer bagunça. era disco pra todo lado no chão da sala, no meu colo, nos sofás. eu colocava um, ele cantava. colocava outro, ele cantava também. quando coloquei o disco do homem que foi ao fórum, ele cantou "moreninha linda do meu bem querer" e eu ri: sabia que era para mim.

eu não tinha paciência. troquei o disco e ainda hoje eu ouço, bem baixinho, a voz dele: "viola está chorando. chorando está meu coração".

Um comentário:

Evandro L. Mezadri disse...

Gostei muito de seus textos, são reflexivos!
Grande abraço e sucesso!