14 julho 2010

As horas que não foram


Não sei se vocês sabem porque é que existe o ano bissexto, e nem sei se esse nosso 2010 foi um ano assim, mas eu fiquei a pensar. E aí, como imagino que alguns saibam, outros não, ou que alguém aqui nunca se preocupou com isso, eu vou contar (e quem já sabe faz cara de surpresa, ok?).

Acontece que os sumérios – aqueles caras da Mesopotâmia mais antiga que já se viu - inventaram de dividir os dias desse jeitinho que hoje a gente conhece: com 24 horas. Só que na real, não é assim que a banda toca, e no final de 365 dias, ou de 8760 horas, sobravam uns quebrados.

Ficavam lá, perdidas na imensidão desse universo, seis horinhas que não podiam virar dia nem noite. Mas como não dá pra ir empurrando tudo com a barriga e usar essas horas todas juntas num final que não se sabe se existe (e se existir ninguém vai receber aviso prévio), alguém – e aí já não sei se é sumério, romano ou grego – fez o favor de deixar certo que de quatro em quatro anos juntaríamos as horas abandonadas: seis mais seis = doze, com outros doze = 24, e faríamos um dia.

Pois é, um dia a mais, ali, no finalzinho de fevereiro. E por que nem dezembro, nem janeiro, justo fevereiro? Porque fevereiro, reparem só, foi um mês que já nasceu perdendo. No começo, lá no calendário romano, o nosso mês do carnaval nem sequer existia e o ano, que maravilha, começava em março, mas isso é assunto pra outra história.

Assim ficou: de quatro em quarto anos fevereiro, o injustiçado, ganha um pouco de justiça e acaba mais tarde. Ganha um dia a mais. Mas não um dia qualquer, porque – e é aí que está o sentido dessa minha enrolação toda – é um dia feito de horas que esperaram quatro anos para acontecer. Um dia feito de horas que deram o lugar na fila e que por quatro anos deixaram as outras horas banais passarem na frente. Horas que ficaram guardadinhas num canto escuro do infinito, contando os minutos.

E aí, no meio do cotidiano todo, da correria do dia a dia, chega a hora daquelas horas serem passo a passo passadas pra trás e finalmente caírem na caixa mágica das horas já usadas. E você aí, achando que uma fila de banco é muito. Elas esperam quatro anos – umas menos, é verdade – pra poder fazer todo o sentido daquela efêmera existência. Afinal, horas só nasceram para isso: serem gastas, serem usadas, serem passadas.

Então, já sabem: no próximo 29 de fevereiro pensem bem no que vão fazer. Trata-se de lidar com alguém muito paciente. É um dia muito especial.



Esse texto foi todo feito com ajuda do Théo, que veja só, há quatro anos faz meus dias serem todos 29 de fevereiro.

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